sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Quebrando galhos



Fui aconselhado, dia desses, a não utilizar termos como “paradigmas”, “conceitualização”, “empreendedorismo”. Que eu deveria medir palavras, olhar antes com quem estava conversando. A justificativa é que meu modo entusiasmado de conviver com o novo, por vezes assusta.
Como não pretendo ser assombração de ninguém, resolvi seguir o “conselho”. Mas para isto há um custo: deverei deixar de ser eu mesmo. É claro que ninguém solicitou tal absurdo, mas esta bem implícito, nas entrelinhas.
Lembrei-me de uma passagem bíblica que diz “quando eu era criança falava como criança”. Ou coisa parecida. Não importa. O caso é que, assustadoramente, os tais termos realmente assustam.
Também lembrei-me de um pedreiro, certa vez em minha casa, que na falta de um ferramental de esquadro, mediu 60cm de uma lado, 80cm do outro, alinhou com uma vara de 1m. Ele disse: pronto, esta esquadrado. E eu disse: isto é Pitágoras, mas ele: não, eu só esquadrei.
Ele não sabia porque, ou como, mas usou a hipotenuza, um triângulo retângulo, um teorema, elevou ao quadrado, tirou raiz, mas no fundo, apenas esquadrou, sem saber o que aquilo significava. E quantas vezes agimos da mesma forma? Quantas vezes decoramos uma sintaxe e acreditamos dominar uma linguagem de programação?
Seria hora que quebrar conceitos ou de quebrar galhos? Sejamos ecologicamente corretos: quebrar um galho é uma agressão a natureza. Assim, sejamos fieis a nossa natureza inovadora e não a agredamos com conceitos de proteção. Os conceitos de proteção são aqueles que garantem o andamento de nossa “vidinha mais ou menos”, que mantêm o status de “assim esta tudo bem” e nos mantém inertes na escalada evolutiva.
Sim, nós evoluímos sim. A cada dia, a cada código, a cada lógica reformulada. Quebrar conceitos é mais do que mudar de idéia, é mais do que mudar de rumo. Até porque, não é possível mudar de um local para lugar nenhum. Quebrar conceitos significa avaliar e experimentar o novo.
Mas o que fazer com o entusiasmo, tão presente e fascinante em nossa vida? Seria o caso de nos fazermos atores, nos aderirmos ao senso comum? Infelizmente, a resposta a estas questões pode estar ligado ao legado financeiro de cada um. Ou seja, se eu não me adequar, estarei fora. E não precisamos de mais desempregados.
Vejamos uma breve tabela de “sinônimos divergentes”:


Ousadia
Desrespeito Hierárquico
Empreendedorismo
Vai sair e abrir o próprio negócio
Dedicação
Puxa saco
Paradigma
Algo muito mal
Crítica Técnica
Agressão Pessoal


É neste cenário que muita gente trabalha, e não somente no ramo da programação, mas em qualquer esfera profissional. É um fato, não há o que fazer. Mas acredito mesmo que é possível mudar. As mudanças tecnológicas, climáticas, históricas acabam por forçar a humanidade a evoluir. E sempre há espaço na evolução.
Deixar de ser você mesmo, nem pensar. Medir palavras é um sinal de bom senso. O que não significa ter que abandonar convicções. Não devemos nos proteger de nós mesmos. Isto seria um re-trabalho. É hora parar de “esquadrar” e começar a compreender Pitágoras. Ao invés de fazer porque mandaram, compreender o como fazer. E o mais importante: saber o que se fez.
É possível fazer uma casa apenas com galhos quebrados? Há possibilidade de se aprender carpintaria exercendo o ofício de quebrar galhos com o próprio peso? Ao pensar nas questões vitais do tipo: quem somos, para onde vamos; vamos tentar pensar antes em: o que somos e como vamos.

6 comentários:

  1. Cara, concordo com tudo isso. Me irrita pessoas que vivem no "equilibrio", na inercia, esperando o mundo a empurrar! Não se aprimoram, nao querem melhorar e te chamam de "nerd" pq vc estuda pra ser o melhor possivel! Se isso é ser nerd, que eu seja até a morte!!!

    Parabens cara!

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  2. Concordo com o fato de que devemos parar de esquadrar, mas é possível um pedreiro ir contra a idéia do engenheiro?
    Se o teu chefe pensa em esquadrar, como você poderá aprender pitágoras?
    Ou melhor: de que adianta aprender? Afinal, eles continuarão pensando em esquadrar.

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  3. Isso ai ale... mas vc continua sendo um puxa saco!! rsrs...

    Juvenal, Ai entra a questao da influencia, vc podeira muito bem influenciar seu chefe!! Como a co-evolução das espécies... isso me lembra a história da águia e da galinha!!!

    Alias o alessandro vive falando disso tbm!!

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  4. A curiosidade está para a criatividade na mesma proporção em que a neofobia para a estagnação.

    Alva Edison disse que para ser inventor eram necessários 30% de inspiração, e 70% de transpiração, se bem me lembro, mas isso foi em outra década, em outro século. A lâmpada nem havia esquentado ainda.

    O problema reside na carga de esforço mental gasta em interpretar um conceito, para em seguida compreender sua lógica, e fazer isso tudo ANTES de aplicar na prática... Ufa... ...cansa.

    É de se presumir que com a evolução humana, o cérebro está se reduzindo, ou antes, vem sendo substituído paulatinamente por um aglomerado adiposo qualquer. E isso, sem querer generalizar, claro.

    Em outras palavras, completando sua lista de sinônimos, ainda que pelo viés do espelho, você podería acrescer:

    Preguiçoso = Tradicionalista
    Amedrontado = Fiel ás orígens
    Clonador = Esforçado
    Gambiarrento = Eficiente
    Limitado = Estável

    Camarada, ainda que não seja exclusividade da área á qual nos dedicamos, convenha que, nela, o exposto é a regra. Ou vêm se tornando.

    Lembra há alguns anos, um tópico dos nossos citava um colega cujo sistema desenvolvido surpreendeu vários "experts", que o julgavam impossível, e então o indagaram como? A resposta: "Fiz, sim, mas não sabia que não dava para fazer...".

    O arrojo, o empreendedorismo, a ousadia, a curiosidade, e a sinceridade são atributos que assustam, que chocam, são bem-vindas apenas quando nada mais resta.

    Mais ainda, tenho visto ao longo dos últimos anos uma imensa e contagiante ausência de força de vontade. Ao que parece, nos cursos mais atuais o que se transmite é que quando algo já existe, não é preciso saber como funciona. Use, e não pergunte mais nada.

    E surpreende mais é que empresas venham se contagiando por esse comportamento. Ainda qe seja óbvio que essas são pernas curtas demais.

    Parabéns, pois este é bom artigo/desabafo, daqueles que rende uma boa tese de conclusão.

    Registro porém, na minha opinião pessoal, mesmo conhecendo o peso que o lado financeiro imputa, o cerne está mais próximo do comodismo. Ou seja, o problema não discrimina berço (pobres ou ricos). É democrático e universal.

    Professor (VBM).
    Tostines vende mais porque...

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  5. ufa! achei alguém com a mesma opinião que a minha sobre esse tipo de assunto.

    Parabéns pelo texto.

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  6. ...fiz-me de tolo para ganhar os tolos e fiz-me de sabio para ganhar os sábios...

    Isso é necessários para continuarmos o trabalho.

    Abraços

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